Iniciada em 2009 com Batman: Arkham Asylum e depois continuada em 2011 com Batman: Arkham City, ambos pelas mãos da Rocksteady, a série de jogos do Batman ganha um novo capítulo nesse disputado ano de 2013, dessa vez pelas mãos da Warner Bros. Montreal.
Mesmo com a própria Warner Bros. e a Rocksteady anunciando que a engine de jogo de Batman: Arkham Origins seria a mesma utilizada nos outros dois games da série e que o estúdio responsável pelos primeiros jogos estaria sempre disponível para algum tipo de consultoria no desenvolvimento desse novo título, era difícil não ficar um pouco desconfiado com essa nova participação do Batman nos games. Afinal, mudanças sempre geram um pouco de desconfiança.
A pior parte é que essas desconfianças estavam um pouco corretas. Batman: Arkham Origins não é um jogo ruim, mas parece que algo se perdeu nessa transição de estúdio e temos a sensação do game ter ficado… incompleto.
Mas vamos falar disso com mais calma.
Faltou ficar mais 10 minutos no forno!
Na trama de Batman: Arkham Origins, o Cavaleiro das Trevas tem agido em Gotham à dois anos. Nesse tempo, o vigilante conseguiu criar uma relação nada amigável com o Departamento de Polícia da cidade, mas ainda é praticamente um mito urbano para a maior parte da população. Os únicos que realmente acreditam na existência do Batman são os vilões que já sofreram pelas suas mãos.
Assim, prestes a lançar uma das suas mais audaciosas ações para assumir controle sobre o submundo de Gotham, o Máscara Negra não pode se dar ao luxo de ter um vigilante na sua cola. Por isso, o vilão coloca um preço de $50 milhões de dólares pela cabeça do Batman, atraindo os 8 assassinos mais famosos do mundo para essa missão: Exterminador, Pistoleiro, Lady Shiva, Crocodilo, Vagalume, Copperhead, Bane e Electrocutioner. O objetivo é eliminar o Homem-Morcego na Noite de Natal.
Vendo alguns vídeos do jogo pela Internet ou até mesmo jogando as suas primeiras missões, a impressão que ficamos com Batman: Arkham Origins é que estamos de posse de um Arkham City com uma nova história. Porém, assim que podemos sair ao ar livre de Gotham e explorar essa cidade, começa a ficar claro que o game precisava ficar mais 10 minutos no forno.
Uma das coisas mais broxantes dos primeiros minutos do jogo é o seu sistema de navegação por Gotham. Em Arkham City, o jogador poderia passear pelos céus do gigantesco bairro fechado por Hugo Strange para abrigar os criminosos da cidade. Em Arkham Origins, nós temos uma grande parte de Gotham pra brincar (um mapa maior do que o de Arkham City), mas navegar por ele é uma missão muito sofrível.
O sistema de vôo do jogo é, em teoria, bem intuitivo: basta girar a câmera para a direção de um prédio ou superfície que aparecerá o botão para apertar e fazer com que o Batman jogue a sua garra até lá e se locomova. O problema começa quando nem todos os prédios são “escaláveis” e não há um padrão evidente do porquê disso. Por exemplo, alguns dos maiores prédios da cidade possuem um tipo de grade na parte de cima. Originalmente eu pensei que essas grades me impediam de ir até lá, mas prédios sem grades também são “inescaláveis”. Então eu comecei a teorizar que talvez esse Batman (por estar em começo de carreira), não teria um alcance tão grande quanto o Batman de Arkham City, então eu teria de chegar mais perto desses prédios pra conseguir usar a garra neles, mas isso também não funcionou. Pior: dá para ir direto do chão para o topo de alguns arranha-céus no jogo, mas não dá para ir ao terraço de alguns prédios de médio porte.
Essa complicação dos prédios torna a missão de se mover pela cidade bem sofrida, porque é comum você planar por alguns minutos até conseguir algum lugar para se mover mais rapidamente.
Para compensar o tamanho do novo mapa e esse sistema de navegação mais ou menos, a Warner adicionou um sistema de fast travel ao jogo. Em qualquer momento, o Batman pode chamar o seu avião e ir para alguns pontos específicos da cidade. Mas esse sistema também tem falhas.
Para liberar os pontos de fast travel pela cidade, o Batman precisa hackear algumas torres de comunicação que estão com uma interferência causada pelo Charada. O problema vem quando é impossível cumprir o desafio de uma dessas torres graças à um bug ridículo. É simplesmente impossível a não ser que você use um outro bug (algumas instabilidades da física do jogo) a seu favor de uma maneira incrivelmente aleatória.
Isso sem chegar no fato de que a WB Montreal não parece entender muito bem o conceito de fast travel. Pra ir de um ponto à outro, nós temos de ver três animações (uma da nave pegando o Batman, uma da nave voando na chuva e a última com o Batman pulando do avião). O carregamento do mapa é feito durante essa segunda animação, mas mesmo usando uma máquina com a configuração recomendada pela WB Montreal e com alguns recursos gráficos desativados para aumentar o desempenho, mas ainda assim era possível começar uma fast travel, sair do quarto, ir até a cozinha, pegar um copo de refrigerante e voltar para o quarto a tempo de ver que a animação ainda não tinha terminado.
Outros pequenos problemas também dão a sensação do jogo estar inacabado. Coisas como a já citada instabilidade na física de vôo, o fato do jogo aumentar o desafio dos combates aumento o número de inimigos ao invés de produzir situações diferentes, alguns gadgets que não são utilizados praticamente em nenhum momento de verdade (eu estou olhando pra você, Concussion Grenade!) e até a simplória desculpa para não ter nenhum civil na rua (“Cidadões de Gotham, o bicho pegou aqui fora e não saiam de casa”).
Mas nem tudo são defeitos…
De fato, nem tudo é problema em Arkham Origins. Sua trama, por exemplo, é bem interessante tanto para fãs de quadrinhos, quanto para “civis”.
Apesar do marketing do jogo vender os 8 assassinos como os principais inimigos do Batman, a verdade é que parte deles está renegada à side-missions e um deles você nem enfrenta. Porém, vale ressaltar que cada batalha com esses assassinos possui suas particularidades e são totalmente diferentes, adicionando variação ao gameplay do título. Essas batalhas poderiam exigir mais? Com a exceção da luta contra o Exterminador (que é difícil!), sim. Mas o resultado final é satisfatório.
Porém, o destaque fique para a aparição do Coringa na trama (não é spoiler, ele já apareceu no material promocional) e o primeiro encontro entre o Príncipe Palhaço do Crime e o Cavaleiro das Trevas. É bem legal ver a relação dos dois nascendo e se tornando a jornada de obsessão que ela é. Esses momentos entre os dois fazem o investimento em Batman: Arkham Origins valer a pena.
Além disso, também é interessante ver as interações do Batman com outros personagens no seu começo de carreira. Nos últimos anos, nós fomos bombardeados com produções envolvendo o Homem-Morcego, todas mostrando um certo status quo em Gotham: Batman é a figura de autoridade moral na cidade, a polícia trabalha com ele, todo mundo confia no cara e o Alfred apóia a ação dele. Os filmes, os games, as animações, os quadrinhos da DC… tudo colabora com esse cenário. Arkham Origins acaba soando como uma refrescante mudança, já que esse cenário não existe: a polícia está atrás do Batman, o Capitão Gordon não o respeita, o Alfred o questiona o tempo todo e o próprio Bruce Wayne possui uma visão bem diferente da cidade e da sua função ali.
Por fim, só queria registrar que achei bem legal a aparição do Anarquia, um desses vilões desconhecidos do Homem-Morcego, mas que são legais pra caramba e que mereciam aparecer num filme em breve. Aliás, o Anarquia teria sido o cara ideal pro plot de Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge, mas isso é papo pra outro dia.
E o que mais esse jogo tem?
Assim como os títulos anteriores, Batman: Arkham Origins apresenta um mapa repleto de distrações e side-quests que vão prender o jogador por algum tempo naquele cenário.
Um ponto positivo dessa vez é a maneira com que essas aventuras paralelas são introduzidas de maneira mais orgânica do que nos últimos jogos. Eu lembro de jogar Arkham City e ver acumular uma montanha de tarefas pra fazer (como caçar o Charada, prender o Pistoleiro, descobrir X, procurar Y). Dessa vez, as coisas vão acontecendo de forma mais natural. O já citado Anarquia, por exemplo, tem a sua própria plotline (que é curtinha), mas que entra na trama principal e faz com que o jogador não tenha problemas em parar o que está fazendo e ir concluir essa side quest. Os produtores aproveitaram as pequenas quedas de ritmo do roteiro para inserir essas intervenções paralelas, colocando variação no jogo e não deixando nem que o plot principal fique cansativo e nem que as side quests sejam chatas de se fazer.
A novidade no sistema de jogo da série são as cenas de crime espalhadas por Gotham, onde o Batman usa os seus dons de detetive para descobrir o que aconteceu, numa vibe meio CSI. Essas cenas de crime são relativamente poucas e o sistema é meio que automático (a única coisa que o jogador efetivamente faz é procurar por um marcador vermelho pra descobrir a próxima pista), mas são momentos interessantes dentro do jogo. Com alguma sorte, a WB Montreal deve personalizar um pouco mais esse sistema num provável novo jogo da série.
Aliás, acredito que o futuro da franquia Batman: Arkham deva ser a personalização. Uma das graças dos dois primeiros jogos era o jogador se sentir como o Batman dentro daquele universo. Esse Arkham Origins já tirou um pouco disso com a repetição da fórmula dos dois primeiros jogos, então a esperança é que o próximo jogo mude um pouco as coisas para retomar esse espírito. Adicionar a possibilidade de escolher as falas do Batman, fazer o jogador realmente trabalhar nos casos ao tirar a automatização das ações do vigilante (por exemplo, essas cenas de crime poderiam revelar uma série de características do criminoso – ele é alto, moreno e com uma tatuagem – e o jogador teria de procurar na database do jogo por alguém com essas características e ir atrás dessa pessoa em Gotham. Quanto mais cuidado na hora de analisar a cena, mais detalhe obtido e mais certeira a investigação, numa vibe meio Carmen San Diego), adicionar mudanças na campanha principal através das ações do Batman e esse tipo de coisa.
Sobre o inédito modo multiplayer da franquia, há realmente pouco a se dizer, já que foi difícil de conseguir jogá-lo porque foi compicado conseguir se conectar aos servidores do título. Porém, quando a conexão foi possível, a experiência foi um pouco decepcionante.
Nesse modo, os jogadores são divididos em dois times dentro de um cenário: a gangue do Coringa e a gangue do Bane. Além disso, uma pitada de jogabilidade assimétrica é adicionada quando dois jogadores entram em campo na pele da dupla Batman e Robin. Os problemas do multiplayer começam quando são 8 pessoas jogando e 6 delas estão usando um personagem (um capanga qualquer) que não se encaixa no sistema de combate físico do título. Enquanto bandido, você se equipa de uma arma para ter alguma chance contra o Batman, mas a mira do sistema de tiro é bem deficiente e enxergar o Homem-Morcego é sinal de que você não vai durar muito tempo. Ainda assim, é bem possível que o meu problema com o modo tenha sido causado pela falta de experiência em jogar como capanga e talvez com o tempo (e atualizações da WB Montreal!), as coisas fiquem um pouco mais divertidas.
Apenas para não deixar esse texto muito longo, vou separar um pequeno parágrafo para falar sobre uma mudança relativamente importante nesse jogo: o dublador do Coringa. Nos dois primeiros Batman: Arkham, a dublagem do personagem ficou por conta do ótimo Mark Hamill (Star Wars), o cara que havia sido a voz do Coringa nas séries animadas, filmes animados e em outras brincadeiras por aí. Dessa vez, quem cuida da interpretação do personagem é o dublador Troy Baker, responsável pela dublagem de outros dois personagens importantes dos games de 2013: o Joel de The Last of Us e o Brooker de Bioshock Infinite. Se eu estava um pouco preocupado com a transição de dublador para o Coringa, essa preocupação se mostrou bem infundada. Baker manda muito bem no papel e consegue substituir Hamill à altura!
Quem também ganhou novo dublador foi o Batman, já que Roger Craig Smith (a voz do Ézio de Assassin’s Creed e o dublador do Capitão América na nova série animada dos Vingadores) substituiu Kevin Conroy, o homem que dublava o Cavaleiro das Trevas. Apesar dessa mudança também seguir sem problemas e Smith se mostrar à vontade no personagem, a performance do novo dublador é menos impactante que a de Troy Baker.
Conclusão
Batman: Arkham Origins é um jogo divertido, embora o nível de aproveitamento do jogo vai depender da paciência de cada jogador. Não tem muitas novidades em relação ao game anterior da franquia, tem problemas de descuido na sua produção e no seu acabamento, mas ainda consegue divertir (eliminar um grupo de 7 capangas sem que eles percebam a sua presença ainda é aquele tipo de coisa que realmente faz o seu sábado a noite valer a pena).
O seu grande trunfo é a utilização da mitologia do Cavaleiro das Trevas e a exploração da sua relação com o seu principal inimigo. Os gráficos estão bem aceitáveis para esse fim de geração e as side-quests ainda estão interessantes o suficiente pra manter o jogador entretido por algum tempo dentro desse cenário.
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